Sete léguas


Andei as sete melhores léguas da minha vida. Passei por caminhos onde só a vida é capaz de levar, onde por ti jurei a vida, onde muito aprendi, aprendi a amar.

Um meio

              
        


       Passaram dias, noites, passei por ruas, becos, bares. Pessoas surgiram e outras desapareceram de repente, mas o telefone não tocava.      

        Estava no banho, quando ouvi a campainha e nua fui até porta, era você sorrindo com as mãos cheias de felicidade para me dar. Aquele abraço foi o melhor da minha vida e só depois daqueles beijos questionei a sua ausência e o silêncio, mais uma vez, prevaleceu. Eu estava tão contente que me senti satisfeita apenas em ouvir da sua boca que me ama, enquanto retirava a caixinha do bolso em símbolo de convocação para que eu seja, em fim, a sua metade.  

Atipicamente inesquecível

       Certo dia, acordei enquanto meu celular tocava. A música era ótima, porém a letra contraditória, em relação ao período que estou vivendo. "Haven't met you yet" tocava acompanhado daquele alerta vibratório de celular. Atendi, aquela voz pela qual me encantei, dizia estar na porta da minha casa. Dei um salto da cama e de cara amassada fui atender a criatura. Dei-lhe um abraço forte e depois um beijo. 
       Era um domingo de sol, tranquilo e nada monótono. O dia passou voando, enquanto tudo corria maravilhosamente bem. Tomamos café da manhã juntos, assistimos desenho animado, nos divertimos, no amamos. Foi um dia realmente atípico, inesquecível. 
        O envolvimento foi total. As cores tornaram-se reluzentes, os sons mais intensos, a visão mais nítida e o tato perdido por outros caminhos. O coração batia muito forte, descompassado, acho que ele desejava somente  uma coisa: amar. A mente se rendeu aos gracejos da emoção, a carne enfraqueceu. 
         Lembrar deste dia, leva a minha mente a rever aquela retrospectiva. Os intermináveis dias de chuva que vivi, antes de conhecer o poder do arco-íris e daquele sol forte, que hoje me cega de felicidade. Aqueles momentos de lágrimas e autotortura que passaram feito tempestades, aquele lamento diante do espelho, aquele sentimento de singularidade. Os tempos de noites frias findaram, agora é hora de banhar-se ao sol e viver. 
         Naquele dia me senti única, ingressa em uma bolha feita para dois, onde ninguém poderia nos ver, nos ouvir e interferir em absolutamente nada. O dia acabou com um sorriso, quando sorri sozinha diante de Nossa Senhora, diante daquele espelho que reflete tudo o que há de melhor em mim. Sorri por perceber que encontrei em você tudo aquilo que sempre procurei, sem saber. 







PS: Texto baseado em fatos reais, e dedicado àquele que me fez provar uma das minhas maiores fraquezas, o contato com os seus lábios. 

Caco de vidro

   
      Nesse instante, sou como aquele copo que quebrou-se hoje, nas minhas mãos. Sinto a morte parte por parte, a frustração presente em cada pedaço meu que cai sobre o solo e aquela tristeza rotineira que me abraça nas noites de domingo. Aquele peso que se deposita sobre o cérebro chama-se consciência, sensação que se tem quando fala-se o que não se deve. 
       Aquelas lágrimas posteriores chamam-se reconstituição das partículas que compõe o meu ser, enquanto o meu auto-controle jura nunca mais mencionar aquilo que disse sem pensar, aquelas coisas todas que vão para o baú de coisas velhas e aquelas porcarias todas que não devem desfilar sobre a minha língua, na sua frente, outra vez.  


Quase mulher



        Que dia movimentado aquele, época de provas, de correria e agitação. Tempos de dupla jornada entre trabalho e universidade, a jornada mais desordenada que vivi e a mais emocionante, segundo os antigos. O meu tempo estava tomado por provas, trabalhos, projetos e reuniões. Morava praticamente na redação e a Dóris andava meio esquecida. 
          As tarefas se multiplicavam, os pensamentos de dividiam e a minha condição de mulher pesava na minha consciência. A depilação era algo de extrema urgência, enquanto a manicure, a podóloga e a tinta de cabelos nem lembravam da minha existência. Os sapatos estavam pedindo para sair do asilo, aquele tubinho preto louco para arrasar nas pistas, enquanto o "all star" e a calça "jeans" não saiam de mim. 
          Arroz e feijão desconhecia desde os dezoito, quando saí de casa e adotei a Dóris. O fast-food tornou-se meu melhor amigo e aquela coluna do jornal a minha maior paixão. Finais de semana se resumiam aos estudos, exceto aquele que não me canso de lembrar. 
            Meados de outubro, na esquina do café, esbarrei na coisa mais linda e perfumada que existe. Conversamos, trocamos número de telefone, marcamos um encontro, foi demais! A distância entre nós era tamanha, mas a vontade de estar perto um do outro aumentava a cada minuto. Ficamos durante tempos até o dia em que decidimos morar juntos. Eu tinha vinte e apesar de tudo, me considerava uma garota de tamanho minúsculo comparado ao mundo a minha volta. 
             Aprendi a lavar, passar, me formei, a Dóris faleceu, as tarefas aumentaram e a minha condição de mulher ainda anda esquecida, escondida em um lugar onde a minha vaidade não me permite ser alcançada. Ele cozinha, me ajuda em quase tudo no nosso quase almoço, no nosso quase casamento, na nossa quase casa e a acreditar que sou linda e maravilhosa, mesmo sendo uma quase mulher.