Primeiro beijo

       
         Enquanto você me devorava com os olhos, naquela pista, ao som de uma música qualquer, eu dançava para você, sorrindo, com ar de provocação. E na realidade eu estava te provocando propositalmente. Eu te chamava com o olhar e com o movimento do corpo te convidava para entrar na minha vida, te conduzia até mim em pensamentos. 
        Aquela noite fora a mais longa da minha triste existência. Afinal, quando notei o seu olhar em minha direção esqueci do frio que sentia, das pessoas ao meu redor, da música que tocava.. A grande verdade é que eu me senti, pela primeira vez, poderosa. Sim, poderosa. Pois, como eu sempre fora tímida e introvertida, nunca havia arriscado nada, absolutamente nada com nenhum homem. 
        E, naquele dia, a iniciativa parecia partir de mim, do meu corpo. Aquela insegurança que me acompanhava durante anos, eu mandei embora, no momento em que me dirigi até você, sorrindo. Dançamos juntos, eu te seduzia por livre e espontânea vontade e eu me sentindo leve, arrisquei um beijo. Um beijo bem aceito, eu diria. devo ter feito tudo errado, mas naquele momento, para mim, nada era errado. Afinal, aquela era a noite em que estava completando dezoito anos de existência e o primeiro contato considerável com um homem. 
         Ficamos juntos durante a noite inteira, perdi minhas amigas de vista, elas nem acreditariam. Ter as perdido de vista foi a melhor coisa que me aconteceu, pois na hora de ir embora, você me ofereceu carona e eu aceitei. Nos beijamos durante uns dez minutos dentro do carro, interrompemos quando acordei do sonho. Me dei por conta de que estava beijando um estranho, em seu carro, sem nenhum conhecido por perto. Me dei por conta que eu nunca havia feito aquilo na vida e me perguntei como eu havia conseguido. A insegurança pediu para entrar, soprou em meus ouvidos, mas não a ouvi. Afinal, eu me sentia incrível e super poderosa, após ter descoberto que nunca é tarde para dar o primeiro passo. 

Freedom


        Se eu pudesse desejar algo sem limitações, eu desejaria ser livre. É livre. Ter a liberdade de poder programar que quero fazer no próximo final de semana, por qual o canto do meu próprio mundo eu vou querer estar e qual pessoa do meu agrado eu vou querer receber aqui. Adoraria, caso eu tivesse a possibilidade de ao menos pensar me libertar de mim, de certos pensamentos, das antigas ideias. 
         Sou grata por tudo o que tenho e procuro sempre valorizar as coisas. Mas infelizmente não tenho fôlego para alcançar a perfeição, que corre veloz, um pouco a minha frente. Quanto as lágrimas derramadas de modo sutil, escorreram em mim, apenas para expressar o meu desejo por liberdade. Por desejar decidir onde quero curtir o meu próprio silêncio, em qual parte do meu quarto quero sentar para observar o nada, ou em qual momento eu desejo dizer boa noite. 
         E a vida vai passando, e esse desejo oscila entre oculto e inexistente, mas que de fato está sempre aqui, batendo na minha porta querendo entrar. Não atendo por acreditar que o dia de abrir essa porta vai chegar. Afinal eu só queria ser livre, esquecer de fazer a guerra e optar pelo dia em que quero fazer amor. 

  

Luis


      Luz da minha vida
      Fiel herói de infância
      Com carinho,
      Destrói minhas angústias
      Me acolhe feito cipó como ninguém

       Um, que vale por mil
       Único por ser meu, só meu
       Embora, pai de todos
       Apesar de seu sangue estar apenas em três
      
       Iluminado pela divina luz
       Mãos de ferro para semear amor em mim
       E assim, braço forte para regar o meu ser
       Conhecimento, razão e valor
       Desaguam em meu corpo

       Sábio por natureza
       Ó meu rei, tua coroa brilha
       Fez de mim princesa
       Da flor mais linda rainha
      
        Teus filhos, no plural
        Exclamam orgulho por ti

        Alegria estar contigo
        Meu eterno amor, amigo
        O único a quem juro a minha vida

         Deise Carvalho para Luis Carvalho






    


    
      
    

Ne me quitte pas


    Minha vida sempre fora boa, sem grandes emoções, mas com muitos sonhos. Sempre me dediquei ao trabalho, aos estudos, a carreira. Defendo as diferenças, me adapto às circunstâncias. Porém, dessa vez, confesso, está difícil. 
        Certo dia, aliás, naquele dia, fui apresentada ao meu novo chefe. Um homem aparentemente frio, robusto e      bastante inseguro. Todos reclamavam dele, falavam pela suas costas e eu, somente eu, o tratava diferente. Eu batia de frente com ele, enfrentava ele mesmo sabendo que corria o risco de perder o emprego. Nós brigávamos, discutíamos, mas sempre nos respeitamos. 
          Ele demonstrava arrogância no olhar, fazia questão de manter estampado na testa o seu "ar" de superioridade e eu não suportava aquilo. Mas, apesar disso, eu sempre o admirei muito. Ele despertava a minha atenção, me fazia ter sonhos loucos todas as noites, me estimulava a me imaginar na orgia em pleno elevador, me fazia feliz, apesar de não saber. 
           Eu sabia que não era amor, não era paixão, não era nada, além de uma atração boba e meio adolescente, talvez. Mas era inevitável disfarçar e ele começou a perceber. Trocávamos olhares durante as reuniões, saíamos para beber, trocávamos uns beijos nas horas vagas. Nada além disso. Ele era solteiro e eu também e não tínhamos nada, além da companhia um do outro, nos momentos de vazio. 
            Era ótimo. Ríamos durante horas, brigávamos durante uns minutos e logo fazíamos as pazes. Mas as nossas personalidades nunca deixaram de ser opostas, contrárias e revoltas uma com a outra. Era domingo, combinamos de nos encontrar, sugeri um "pub". Fomos até lá, ouvimos boa música, conversamos e ele me falou sobre uma viagem que estava planejando fazer com uma mulher que ele havia conhecido. Pela primeira vez e imediatamente demonstrei ciúmes, dei um show de ironias. E claro, brigamos. Ele estava certo de que iria fazer essa viagem, me chamou de infantil, disse que o que aconteceu entre nós foi uma boa amizade. 
             O mundo caiu, mas ele estava certo. Nunca estabelecemos um compromisso, um acordo ou qualquer coisa que determinasse uma união, um namoro. Saí do local abatida, perdi o rumo, emagreci alguns quilos em uma semana. No dia da viagem, fui até o aeroporto. Me despedi, chorei e jurei nunca mais correr atrás dele, caso ele atravessasse aquela linha de embarque. Ele foi. 
             Já faz um mês que estamos distantes e tanta saudade sinto, daquele cara sensível e frio. Portanto, hoje resolvi tentar comunicação, há cinco minutos enviei um e-mail escrito "ne me quitte pas"... São quatro palavras, que dizem o que sinto, o que quero, o que preciso. As quatro palavras que ressaltam a minha última tentativa, para não desapontar as mulheres, já que vivemos tentando. 

Combustão


           Em nossos braços feitos de pano
           Formou-se um nó
           Indestrutível por natureza, livre de qualquer dano
           Atado por amor, linha, pano e pó
           Reforçado por intensidade
           Aquecido apenas por refletir um pouco de nós
           Um pouco do muito que somos, sem vaidade
           De tecido sensível, o meu mais rijo, enquanto o teu tão frágil
           
            Nossas pernas andam em passos paralelos
            Resistentes apenas por andarem juntas e no rítmo
            Conforme a vida leva, conforme a melodia
            Ininterruptos tornam-se os elos
            Que cercam este nó afastando melancolia
             Deixando aqui dentro inquieto o meu pedinte coração de palha
             Enquanto vagarosamente, para causar suspense
             Você acende o fósforo e sussurra 
             E o coração hesita que muito não pense
             Para que acidentalmente caia aqui dentro 
             Pois o álcool minha alma já pôs sobre a mesa
             A espera da labareda

              Porém, enquanto isso, meu sangue feito de "Cabernet"
              Corre enlouquecido de cá para lá, de lá para cá
              Formando sorriso no rosto, trazendo a mim beleza
              Por fora já não mais boneca, por dentro correnteza.

               Deise Carvalho 
              
             
        
           

Um, feito de dois


     Meu nome é Caio, tenho 20 anos, sou estudante de arquitetura, pianista nas horas vagas e escritor quando apaixonado. Você deve estar se perguntando se sou bonito, solteiro e natural de onde. Então, não me considero bonito, apesar de gostar muito dos meus olhos, quanto ao estado civil vou contar adiante. Sou natural de Porto Alegre, porém residente em São Paulo, capital. 
       Há um ano atrás, durante um intercâmbio na Itália, eu conheci uma menina, a Helena. Ela era brasileira, porém residente na Itália e filha do casal que iria me hospedar em sua casa. A  família me recebeu de braços abertos, Helena sempre se mostrou simpática e muito atenciosa comigo. Em pouco tempo, eu já estava apaixonado e muito envolvido por ela. Começamos a namorar, éramos felizes e nos divertíamos bastante. Certo dia, cheguei em casa, acessei a minha caixa de entrada para ver os e-mails novos. Havia um e-mail, cujo remetente era uma tal de "Gi", dizendo que havia gostado muito de conversar comigo e me convidando para uma conversa via "msn". Achei estranho, já que não lembrava de "Gi" alguma, mas respondi o e-mail de forma simpática. 
      Durante meses foi assim, trocava e-mails diariamente com "Gi" e sentia uma ótima sensação sempre que via uma nova mensagem na minha caixa de entrada. Eu aguardava os e-mails ansioso e me envolvia a cada mensagem. Era segunda feira, cheguei em casa e fui ler a mensagem do dia, fiquei triste, pois a "Gi" não me escreveu. Passou uma semana e eu não aguentava mais a saudade daquela que descobri ser a pessoa mais fantástica que conheci. 
       Meu namoro estava morno, pois fui me tornando cada vez mais distante, Helena já era apenas uma boa amiga, com quem eu trocava uns beijos. Mesmo sem conhecer, "Gi" não saía da minha cabeça. Resolvi adicioná-la no "msn", ela estava online e antes de qualquer outra coisa disse que queria encontrá-la. O estranho é que não havia foto no "msn" dela, mas isso só aumentava a minha curiosidade.
       Interrompi a viagem e vim para o Brasil imediatamente, marcamos em São Paulo, já que "Gi" disse residir no Brasil. Marcamos no aeroporto, ela disse que iria toda de branco. 
        Desembarquei, fui ao ponto de encontro, havia um homem todo de branco e não uma mulher. Parecia ansioso, assim como eu. Esperei ela durante, cinco, dez, vinte minutos... Porém notei que aquele cara estava ali, me olhando de modo fixo. Então fui até ele e perguntei seu nome. E obtive a resposta "Giovanne"!
          Era ele, vestido de branco, bonito, simpático. Conversamos durante horas e eu o questionei sobre a mentira. Ele disse havia me visto um dia, antes de eu viajar para a Itália, na universidade, falou que conversamos e que desde então, não me tirou da cabeça. Nesse instante, percebi que realmente ele não era estranho, porém me senti no meio de uma encruzilhada. Afinal, eu estava apaixonado por aquela pessoa, por aqueles e-mails, por tudo o que havia descoberto. 
           Eu estava amando um homem. Sem saída, arrisquei um beijo ali mesmo, um beijo bem aceito. E foi no aeroporto de Guarulhos que eu encontrei o meu passaporte rumo a felicidade e ao amor verdadeiro. 

 Hoje somos um, feito de dois. 

Invisível

Minha franja escurecida tornou-se a sombra dos meus olhos
A sombra que não me permite enxergar o sol
Que raia uma luz, que me dizem ser existente
Daqui sinto apenas o vento, que vem até mim
Traz e leva ilusões e desejos
Que não penetram em mim
Apenas
Vêm
E
Vão
Como todas as lembranças
Que pego e solto no ar
Daquele tempo de luta por tudo aquilo
Que me dizem ser verdade
Mas que não vejo, nem sinto
O sol que raia claridade
Mas, que se esconde propositalmente 
Dos plebeus e servos do nosso feudo atual
Escuridão vista por nós como algo normal